A sucessão da família Imperial japonesa encontra-se em profunda crise. Há poucos homens na linha de sucessão e a lei estabelecida em 1947 determina que mulheres não são elegíveis ao trono crisântemo.
Essa lei contradiz a própria história do Japão, afinal, dos 126 monarcas, oito foram mulheres. Há também a lendária Imperatriz guerreira Jingū que liderou uma exitosa campanha militar que conquistou a Coreia.

Destaque importante para a 33ª Imperatriz, Suiko Tennō. Foi sob seu reinado que o príncipe Shōtoku, nomeado pela Imperatriz como seu regente, criou o que se entende hoje por estado nacional ao redigir a primeira constituição no ano 604.
Hoje, as mulheres da família Imperial não só não podem ascender ao trono, como também são alvo de críticas por jornais, tabloides, internet e por parte da sociedade evidenciando a violência de gênero que ainda persiste no Japão.
Violência psicológica que se torna doença
Diferente dos homens que podem ascender ao trono, todo o peso de gerar um herdeiro do sexo masculino recai sobre os ombros das mulheres. A atual Imperatriz Masako é um exemplo dessa bigorna social.
Durante anos ela foi literalmente cobrada pela sociedade a ter um filho, porém, o casal teve apenas uma filha, a princesa Aiko.
O inferno vivido pela Imperatriz Masako ficou menos pior em 2006 com o nascimento de Hisahito, filho do príncipe herdeiro Fumihito.

A Imperatriz emérita Michiko também sofreu um episódio de forte estresse quando Akihito se tornou Imperador em 1989 após a morte de seu pai Hirohito.
Ela sofreu um episódio de afasia psicogênica em outubro de 1993, no dia de seu aniversário de 59 anos.
Tanto Masako como Michiko são mulheres ‘plebéias’, o que torna tudo ainda mais complicado.
Entre as dificuldades, Michiko se tornou Imperatriz após um Imperador que até 1945 era considerado um deus (deidade) vivo, e Masako não gerou um herdeiro legal ao trono.
O peso da coroa de Masako
Masako foi uma das raras diplomatas mulheres do Ministério das Relações Exteriores formada. Foi diplomada Baccalaureus Artium com dignidade Magna Cum Lade (com grandes honras) em economia na Universidade de Harvard.
Cursou relações internacionais na pós-graduação na prestigiada Balliol College, Universidade de Oxford.
Trabalhou negociando tecnologia de supercondutores com os EUA, além de ter conhecido os ex presidentes Bill Clinton e Boris Yeltsin.

A Imperatriz poderia ter tido uma impressionante carreira pública e recusou os pedidos de casamento de Naruhito (que insistiu ao longo de seis anos), contudo, abriu mão de mulher de estado para se casar com o príncipe herdeiro.
Quando o casal Imperial se casou em 1993, houve expectativas de um novo herdeiro dado que o último homem nascido na família Imperial foi o príncipe herdeiro Fumihito em 1965.
A pressão sobre ela foi tamanha que durante anos ela se manteve fora da vida pública com graves sintomas de depressão.
As cicatrizes permanecem até os dias de hoje e ela se mantém relativamente afastada dos compromissos públicos.
Michiko e Akihito: o príncipe e a plebeia
Michiko se formou com Summa Cum Lade, (com a maior das honras) pela Universidade do Sagrado Coração de Tokyo no curso de literatura, foi presidente do corpo estudantil e foi oradora de sua turma. A Imperatriz emérita também passou por cursos em Harvard e Oxford.
Quando a coroa japonesa repousou em sua cabeça em janeiro de 1989, periódicos e tabloides com pouca ou nenhuma ética atacavam semanalmente a Imperatriz em suas edições comparando-a com o Imperador Showa.

Apesar de toda a publicidade negativa criada em torno dela, ao longo do tempo a Imperatriz emérita foi capaz de cativar a população com sua natureza dócil e gentil.
Contudo, diferente da atual Imperatriz Masako, Michiko teve três filhos, o Imperador Naruhito, o príncipe herdeiro Fumihito e a Princesa Nori (Sayako Kuroda), portanto, nesse aspecto, não sofreu o mesmo que sua sucessora.
Como Harry e Meghan
A ex-princesa Mako também não pôde escapar do escrutínio patriarcal da sociedade japonesa. O assédio midiático e social em relação a sua relação com o então noivo Kei Komuro, também plebeu, a levou a um estado de PTSD (perturbação de estresse pós-traumático).
Após a revelação pública do relacionamento entre os dois e o anúncio do noivado, Komuro se viu envolvido em uma disputa financeira com a mãe de sua ex noiva.
O casal foi atacado constantemente na internet, revistas e tabloides que sobrevivem de fofocas e intrigas.

Seu casamento com o plebeu Komuro foi celebrado no dia 26 de outubro de 2021. Além de abandonar seu status na família Imperial, Mako foi viver nos EUA em novembro, país onde Komuro trabalha.
Atualmente a ex-princesa do Japão leva uma vida comum. A psiquiatra Sayoko Nobuta, especialista em violência doméstica comentou o caso: “Acredito que o principal objetivo da ex princesa era escapar, acho que ela viu em Komuro alguém que poderia ajuda-la a conquistar esse objetivo”.
Direitos humanos para todos?
Sayoko Nobuta afirma que é como se não houvesse direitos humanos para a família Imperial, principalmente para as mulheres.
Além disso, a Imperial Household Agency já divulgou informações erradas sobre a condição de saúde psicológica das mulheres Imperiais.

A agência não tem uma política clara nem aparenta saber como lidar com esse tipo de situação (interna e externa).
Rika Kayama, psiquiatra especializada em doenças mentais e famosa comentadora social do Japão comentou sobre os ataques contra a ex-princesa Mako:
“Ainda que Mako fosse instruída a ignorar ou não se envolver com os ataques online, é impossível impedir que esse tipo de coisa influencie na vida cotidiana. É inevitável que isso rasgue o coração de qualquer pessoa”.
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Princesa Aiko em foco
Agora, quem está em evidência é a única filha do casal Naruhito e Masako, a princesa Aiko. Ela acaba de completar 20 anos, ou seja, está pronta para cumprir com as obrigações da família Imperial.
Quando era mais nova, se tornou alvo de especulações públicas sobre sua saúde mental, assim como Michiko, Masako e Mako, mas pela ausência prolongada na escola e uma perca de peso causada por bullying no ambiente escolar.

Ao contrário da tendência midiática negativa de tabloides, a maioria dos japoneses se mostra favorável que uma mulher assuma o trono crisântemo.
Contudo, a força política conservadora permanece forte o bastante para barrar uma lei que permita a sucessão feminina.
É preciso celebrar os avanços da sociedade japonesa em relação a violência e a brutal desigualdade de gênero no país.
Mas, se as próprias mulheres Imperiais sofrem com esse tipo de violência e desigualdade, ainda há muito o que fazer para além da ponta desse iceberg.
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