Depois de um ano de restrições e de um mundo que deixou de ser o que era, talvez para sempre, os impactos sociais e econômicos ainda parecem desconhecidos. Mas como a Geração Z do Japão está lidando com essa mudança tão abrupta?

Há muitas incertezas sobre o estado emocional dessa geração. Se a Y (1980 – 1996), ou os Millenials são consideradas uma geração perdida, seus sucessores estão, de certa forma, sacrificando sua juventude pelo bem comum.
Nesse artigo você verá algumas pesquisas realizadas por veículos de comunicação sobre a saúde emocional e financeira dos jovens japoneses nesse período de restrições causado pela pandemia do novo SARS-CoV-2 e retrospectos da situação econômica do Japão. Confira.
Geração Z e seus antecessores
A Geração Z são aqueles que nasceram entre os anos de 1997 e 2010 (sociólogos entendem que é a geração entre a segunda metade dos anos 90 até o início do ano de 2010), ou seja, nascidos imersos a tecnologia (sem regulamentação diga-se de passagem).

E essa é uma diferença crucial no que diz respeito aos Z e seus antecessores, afinal, a tecnologia fez parte da construção das relações sociais com redes sociais, como o Fotolog (2002 – 2016), Orkut (2004 – 2014) e o Blogger, plataforma lançada em 1999.

Todas essas ferramentas tecnológicas foram amplamente utilizadas pela Geração Y (incluindo o ainda ativo ICQ lançado em 1996 e o também ativo MSN lançado em 1999), porém, a diferença é que essa geração foi a última a viver em mundo analógico.

Por consequência, a Geração Z é a primeira a crescer em um mundo interligado pela tecnologia e globalizado. Há uma grande pressão pairando estes jovens e sucedeu uma geração que enfrentou diversas crises.
Década perdida e falta de perspectiva
No Japão, a anterior cresceu na década perdida de 90, no entanto, estudiosos concordam que foram duas décadas perdidas, especialmente pela crise financeira de 2008 desencadeada nos EUA e derrubou a economia mundial.
Com isso, desde o início da década de 90, japoneses das Gerações X (1965 – 1980) e Y de todos os níveis de educação viram cada vez mais empregos estáveis diminuírem as ofertas e cada vez mais trabalhos temporários os absorverem sem quaisquer garantias.

A partir de 1992 a dívida pública do Japão começou a subir, até que em 1997 chegou a 105% do PIB, ou seja, naquele ano, representava toda a riqueza produzida no Japão mais 5%.
Pobreza
Isso demonstra que embora seja um país desenvolvido e industrializado, com uma infraestrutura invejável, há uma pobreza enorme que foge aos olhos de turistas que não percebem as sutilizas e as sombras de um país.
Afinal, 15,7% de sua população vive na pobreza e uma em cada sete crianças abaixo da linha da pobreza.

Futuro incerto
Essa bomba relógio continua armada e poderá explodir nas mãos principalmente da Geração Z.
Atualmente a dívida pública japonesa está em acima de 224,8%, ou seja, as dívidas do governo, instituições privadas, organizações sem fim lucrativos e dos cidadãos (menor parte da equação) é duas vezes mais um ¼ praticamente de todas as riquezas produzidas no Japão em um ano.
Economia: mesmo com desafios, nem tudo está perdido
A SMBC Consumer Finance, uma instituição financeira pertencente ao grupo empresarial SMFG (Sumitomo Mitsui Financial Group) conduziu uma pesquisa realizada em novembro com 1000 jovens por volta dos 20 anos sobre suas vidas financeiras.
O resultado revelou que, em média, os jovens conseguiram criar uma poupança de JP¥ 720 mil (R$ 36. 675,65) desde o início da pandemia, um aumento de JP¥ 190 mil (R$ 9.678,30) em relação à última pesquisa realizada pela instituição em dezembro de 2019.

Aqueles que vivem juntos tiveram um aumento nas economias ainda maior, de JP¥ 700 mil (R$ 35.656,88) para JP¥ 1.3 milhões (R$ 66.219,93), um surpreendente aumento de JP¥ 600 mil (R$ 30.563,04).
Mudança de mentalidade
Essa mudança de mentalidade aconteceu por causa da pandemia, e consequentemente, na queda da renda, escassez de empregos e menos espaço para gastar dinheiro fora de casa. Os jovens estão mais conscientes, quanto ao valor e o uso do dinheiro no Japão.
Sem reservas ou pouca
Apesar da boa notícia, 18,2% dos entrevistados, a segunda maior população de jovens, não conseguiu criar nenhuma reserva no último ano e a maior parte dos entrevistados (40,8%) juntou até JP¥ 500 mil.

Os que conseguiram juntar de JP¥ 500 mil a JP¥ 1 milhão representam 14,1% dos entrevistados, 10,2% juntaram entre JP¥ 1 milhão e JP¥ 2 milhões e 6,6% dos entrevistados conseguiram criar uma poupança entre JP¥ 2 milhões e JP¥ 3 milhões.
De acordo com a SMBC Consumer Finance, as economias médias de um jovem japonês solteiro na casa dos 20 anos é de JP¥ 610 mil (R$ 31.072,43), um aumento de JP¥ 140 mil (R$ 7.131,38) em relação à última pesquisa de dezembro de 2019.
Gastos e aposentadoria
Os jovens da geração Z japonesa foram indagados sobre seus gastos desconsiderando despesas essenciais como alimentação, higiene pessoal e transporte.
A maioria (29,2%) gasta menos de JP¥ 10 mil, seguidos de 18,2% que gastam entre JP¥ 10 mil a JP¥ 20 mil.
Os que gastam entre JP¥ 20 mil e JP¥ 30 mil representam 15,2%. Há também os 13% que gastam entre JP¥ 40 mil e JP¥ 50 mil e os 10,2% que não gastam nada.

Segundo a maioria dos jovens da geração Z, para viver aposentadoria confortável seriam necessários JP¥ 5 milhões e JP¥ 10 milhões (21,5%).
Para 20%, o valor variou entre JP¥ 10 milhões e JP¥ 20 milhões, 17,4% acreditam que é necessário menos de JP¥ 5 milhões e 12,1% ficam satisfeitos com JP¥ 20 milhões e JP¥ 30 milhões.
De acordo com a SMBC Consumer Finance, os gastos subiram ligeiramente na pesquisa de novembro de 2020 em JP¥ 638,00. A expectativa de poupança para aposentadoria viu uma queda de JP¥ 4.3 milhões.
Alerta vermelho para a depressão
Desde o início da pandemia, o número de casos de depressão, ansiedade, violência doméstica, abuso infantil e suicídio no Japão e no mundo subiram para níveis assustadores, verdadeiras pandemias mentais desencadeadas pela do novo coronavírus SARS-CoV-2.
Uma pesquisa conduzida pelo National Center for Child Health and Development entre os meses de novembro de dezembro de 2020, com 3.705 pais ou responsáveis de 924 crianças e adolescentes mediu o nível de estresse, ansiedade e depressão de jovens do ensino fundamental, médio e ensino superior.

Os dados são alarmantes. Entre os alunos da educação fundamental, 15% das crianças possuem sintomas entre moderados e graves.
Além disso, 6% das de todas as crianças do ensino fundamental e superior disseram ter pensamentos suicidas diários ou desejos de automutilação.
Em relação aos alunos do ensino médio, 24% apresentavam sintomas entre moderados ou graves.
Já no ensino superior a quantidade foi de 30% dos alunos. Não obstante, 29% dos pais e responsáveis também sentiam sintomas moderados ou graves de depressão.
As questões realizadas pelo National Center for Child Health and Development foi baseada nos protocolos internacionais de saúde mental. Esses números são reflexos diretos do efeito da pandemia de COVID-19 na vida destas pessoas.

Como pensam
Um estudante da quinta série da prefeitura de Hokkaido disse aos seus entrevistadores: “Vamos ter medo do coronavírus pelo resto de nossas vidas? “Qualquer um pode pegar uma gripe, não importa quanto cuidado tome, então, por que devemos sempre ficar dentro de casa? Eu apenas tenho um tempo para viver, e há lugares que quero ir e pessoas que quero encontrar”.
Uma estudante do segundo ano do ensino médio da prefeitura de Aichi questionou: “Exceto pelas aulas, todas as outras atividades escolares foram canceladas. Como é que os adultos dizem às escolas para impedir os alunos de sair de casa, mas esses mesmos adultos apenas fazem o que querem? Não consigo entender isso”.
Além dos pais e alunos
Embora ainda não tenham dados consolidados pelo Ministério da Educação, Cultura, Esporte, Ciência e Tecnologia, a saúde mental dos profissionais da educação no Japão vem se degradando a um ritmo galopante.
Os últimos dados do ministério são de 2019, o ano pré-pandemia. Em 2018, 5.212 professores pediram licença de suas atividades por causa de problemas psicológicos como depressão, ansiedade.

Em 2019, 5.478 professores solicitaram licença de suas atividades pelos mesmos problemas. É o maior número desde 2009, ano seguinte a crise financeira de 2008.
Pediram licença 2.647 professores do ensino básico, 1.387 do ensino fundamental, 768 do ensino médio, 649 de escolas para necessidades especiais. No total, 3.096 eram mulheres e 2.382 homens.
Outro número que chama a atenção são os crescentes casos de professores notificados por comportamentos impróprios, foram 4.677 notificações incluindo 550 envolvendo castigos físicos.

Com a pandemia do SARS-CoV-2, ainda não é conhecido os efeitos psicológicos e econômicos na vida dessas pessoas. Porém, dificilmente a situação será melhor do registrado em 2018 e 2019.
Vale lembrar que alguns desses profissionais também fazem parte da Geração Z e muitos são os Millenials, a geração perdida.
Afinal, os Millenials foram a primeira geração na história a não ter mais êxito econômico (e inteligência emocional) que seus pais.
Poucas previsões e muitas preocupações
Se há algum caso positivo na pandemia do novo coronavírus, ela é reduzida a uma escala pessoal/individual.
As emissões de carbono continuam quebrando recordes, a mudança climática é uma realidade, a economia e a política estão em colapso, e esses são apenas alguns exemplos de incontáveis verdades que precisamos lidar enquanto humanidade.
Mulheres mais afetadas
No entanto, em alguns lugares a situação é muito mais complexa. Na Coreia do Sul e Japão, por exemplo, os mais afetados economicamente, e por consequência, psicologicamente, são as mulheres mais jovens da Geração Z.

Primeiras a serem demitidas
Elas foram as primeiras a serem demitidas, não possuíam reservas e na maioria dos casos, ou ganhavam menos que seus colegas homens, ou trabalhavam como garçonete, recepcionista, ou algum cargo baixo por causa do sexismo no mercado de trabalho japonês e sul-coreano.
Propensas a cometer suicídio
Essas mesmas mulheres na faixa dos 20 anos são as mais propensas a cometerem suicídio, na verdade, os casos entre mulheres japonesas abaixo dos 30 anos subiram 30% em 2020. Em alguns meses específicos como outubro de 2020, o aumento foi de 70%.
Pandemia de doenças psicológicas: precisamos falar sobre isso
Especialistas em saúde mental do mundo inteiro alertam para um tsunami de casos de doenças psicológicas que desencadearão em uma verdadeira pandemia – que já está acontecendo, mas não recebe a devida atenção.
A situação no Japão é dramática, especialmente para as mulheres jovens abaixo dos 30 anos.
Muitas vivem sozinhas, trabalham em empregos temporários, não tem poupança ou uma rede de segurança, isto é, amigos e familiares com quem contar.

Em muitos casos, os estudos foram interrompidos pela necessidade e situações familiares degradantes, com fuga de casa para ficar longe de agressão e violência.
Além disso, por viverem em uma sociedade criada e voltada para o homem, é praticamente impossível conseguir um emprego estável com ganhos equitativos.
Com a pandemia e a perca da única e escassa fonte de renda, muitas jovens se desesperam e tiram suas vidas.

Quando a atriz Yuko Takeuchi tirou sua vida no dia 27 de setembro de 2020, nos 10 dias seguintes foram registrados 207 suicídios entre mulheres. Porém, nesse caso, a maioria das vítimas eram mulheres da mesma faixa etária (40 anos).
Em outubro de 2020, mês mais assombroso, foram cometidos impressionantes 879 suicídios.
Mais inacreditável ainda foi a quantidade de óbitos relacionados ao COVID-19 e ao suicídio até aquele momento: 2.087 por COVID-19 e 2.199 por suicídios entre homens e mulheres.

Esse problema não desaparecerá do Japão e pode aumentar se não for feita uma campanha séria e a sociedade japonesa começar a falar de forma mais incisiva e direcionada, de forma acolhedora e compassiva.
O problema é particularmente mais agudo entre as mulheres, o que não significa sob nenhum aspecto que isso não afete os homens também.
E isso é importante frisar e relembrar: os homens não sofrem menos psicologicamente do que as mulheres.
Um futuro para desbravar e construir
Como afirmou o filósofo brasileiro Clóvis de Barros, “estamos vivendo em um mundo em que acordamos sem saber como o dia poderá terminar”. Para a maioria das pessoas, o mundo virou de cabeça para baixo e a sensação de estabilidade e segurança desapareceu.
Apesar de parecer algo novo, essa realidade sempre andou lado a lado com essa falsa sensação de segurança. A pandemia do SARS-CoV-2 apenas jogou luz para problemas já existentes há muito tempo.

Embora seja assustador não ter uma perspectiva de futuro porque a realidade do presente se transforma em um ritmo tão rápido, que é até difícil acompanhar tudo o que acontece, ao mesmo tempo, a Geração Z será a responsável por transformar o mundo em um lugar mais civilizado.
É, talvez, a geração mais engajada com a pauta ambiental e está exigindo rupturas com os modelos patriarcais da sociedade, seja na família ou no mercado de trabalho.
Apesar das gerações predecessoras precisarem acompanhar com cuidado as questões psicológicas dessa geração revolucionária, é preciso ter fé que eles serão capazes de criar um mundo mais equilibrado e corrigir essa rota suicida.
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Dados e fontes: BBC, Nippon, Open Access Government, Emerald Insight, Focus Economics CeicData
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