O governo japonês anunciou uma parceria com o TSMC (Taiwan Semiconductor Manufacturing Co.) e subsidiará indústria de semicondutores do Japão para ressuscitar o setor altamente sensível e essencial para as novas tecnologias.
Semicondutores são chips microscópicos menores do que um vírus, uma tecnologia de tamanha complexidade que é muito mais difícil de ser reproduzida, do que a criação de uma bomba nuclear, por exemplo.

A parceria do Japão com a TSMC será realizada por meio da Sony Semiconductor Solutions Corporation. A planta da fábrica será instalada (já em progresso) na cidade de Kikuyō, Prefeitura de Kumamoto.
Toda indústria moderna depende de semicondutores para seus produtos e a demanda atual é muito maior do que a oferta, afinal, existem apenas 54 empresas no mundo que fornecem a tecnologia, por isso é fundamental para o Japão se tornar um fornecedor desse ativo.
O que é um semicondutor
Apesar de ter se tornado essencial para a manutenção das atividades sociais e econômicas a partir da segunda década do século XXI (21), os semicondutores são uma descoberta do século XIX (19).

Mas foi só a partir da década de 40 do século XXI (21), que os ancestrais dos atuais semicondutores, os transistores e válvulas a vácuo, começaram a fazer parte no cotidiano mundial em tecnologias como os rádios, por exemplo, e mais futuramente, as televisões.
Hoje, os semicondutores têm uma substância conduzindo eletricidade e outra isolante.
Em geral, os elementos mais utilizados para a produção de semicondutores são o silício e o germânio, mas também são comuns o arsenieto de gálio e o antimonito de índio.

Como dito na introdução do artigo, é mais fácil construir bombas nucleares, até mesmo foguetes espaciais do que semicondutores.
Um semicondutor mede, em média, um bilionésimo de metro, ou seja, 0,000000001 metros, ou 10 nanômetros, logo, é necessário altíssima capacidade tecnológica para sua produção.
Metais raros e as tensões entre China e EUA
Metais raros em geral são vitais para a indústria de semicondutores. Vale um parêntese para ressaltar que, embora o nome comum seja ‘metais raros’, eles não são exatamente raros e na verdade existem em abundância.
Porém, poucos países estão dispostos a pagar o preço ambiental que é necessário para extrair esses metais raros. A China é o maior extrativista desses minérios essenciais para a funcionalidade da sociedade atual.

Esse é um dos principais motivos que os EUA entraram em rota de colisão com a China, para ter acesso a esse “escasso” recurso natural fundamental para o crescimento econômico e os interesses estadunidenses.
Ademais, a internet das coisas, o 5G, o desenvolvimento da inteligência artificial cloud computing, carros autônomos e toda a sorte de tecnologia só pode ser desenvolvido com os semicondutores, produto tão disputado dado a escassez dos ‘metais raros’.
O papel do estado na economia
É comum encontrar o discurso no seio da sociedade contra subsídios governamentais alegando que esse tipo de política torna a competição entre companhias desiguais.

Porém, a realidade por trás do discurso é outra. Países literalmente vão à guerra para defender os interesses de suas empresas.
Na história recente pode-se elencar a invasão do Iraque em 2003 pelos EUA e a intervenção militar da OTAN na Líbia em 2011 (ambos estados pretendiam vender petróleo em outras moedas diferentes do dólar e deixar empresas internacionais sem acesso as reservas nacionais).

Além disso, existem várias ferramentas de concessões que os estados possuem para dar vantagens as suas empresas ou até mesmo empresas estrangeiras. No caso do Brasil, por exemplo, há um mecanismo chamado REFIS (Programa de Recuperação Fiscal).
Evasão e monopólio
Em tese, o mecanismo permite que as empresas renegociem suas dívidas junto ao estado (impostos). Na prática, grandes empresas e corporações renegociam anualmente e indefinidamente suas dívidas.
Por outro lado, as PMEs (Pequenas e Médias empresas) raramente conseguem renegociar suas dívidas, dessa forma, as grandes empresas mantêm vantagens econômica e comercial por meio de leis que as favorecem.

Pode-se também observar um processo semelhante nas gigantes estadunidenses, especialmente as big-techs que, por fala de regulamentação ou por lobby, deixam de pagar impostos enquanto monopolizam tanto o mercado de dados, quanto os marketplaces.
Portanto, a ideia de que os estados nacionais mais ricos do mundo são economias liberais (com exceção da China), isto é, sem que o estado interfira na economia, é uma ilusão que beneficia as grandes empresas em detrimentos dos pequenos e médios empreendimentos.
Políticas de segurança nacional
O Japão é, sem quaisquer sombras de dúvidas, um dos países com as políticas industrias mais pesadas do mundo, afinal, seria impossível para as empresas japonesas se projetarem internacionalmente sem a ajuda do estado.

E é para isso que o Ministério da Economia, Comércio e Indústria atua, proteger as empresas japonesas das companhias rivais e garantir sua competitivas na vanguarda econômica e tecnológica.
Além da serem fundamentais para o crescimento econômico, empregam muito e mantém o consumo interno aquecido. É na indústria onde a remuneração é maior aos trabalhadores em relação a outros segmentos econômicos.

Por isso, é fundamental ter políticas industriais como subsídios. Sem eles, é praticamente impossível ter autossuficiência tecnológica como rede 5G e os semicondutores.
Atualmente existem apenas 13 polos de semicondutores no mundo: Japão, China, a província de Taiwan, Singapura, Alemanha, EUA, Itália, Israel, Irlanda, Índia, Reino Unido, Canadá possuem plantas industriais que produzem semicondutores.
O Brasil possui a única empresa da América Latina de semicondutores, a CEITEC S.A. (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada), uma estatal que só não foi liquidada, isto é, dissolvida, por decisão do TCU (Tribunal de Contas da União) em setembro de 2021.
Investimentos na indústria dos semicondutores
No atual acordo entre o governo japonês e Taiwan, o Japão fornecerá um subsídio de JP¥ 400 bilhões (US$ 3,5 bilhões) para a construção da planta de Kyushu, na cidade de Kikuyō, Prefeitura de Kumamoto, o que representa metade do investimento.
Contudo, as parceiras Sony Semiconductor Solutions Corporation e a TSMC deverão operar por pelo menos 10 anos, não permitir vazamentos ou transferência de tecnologia para competidores internacionais e garantir estoque (aumentar a produção) para as necessidades nacionais antevendo eventuais falta de materiais raros no mercado.
Além da nova indústria de Kikuyō, o governo japonês subsidiará a expansão das plantas já existentes em um terço.
Por hora serão contempladas oito companhias nacionais de tecnologia em seis das sete prefeituras de Kyushu.
O governo japonês já possui planos para a expansão desse segmento industrial sensível para as demais regiões do país por meio de parceria com outros institutos de tecnologia nacionais.
Desafios práticos
A planta de Kikuyō deverá entrar em operação em 2024 e deverá empregar cerca de 1500 profissionais, porém, não será uma tarefa simples materializar as ambições do governo japonês para sua autossuficiência na indústria de semicondutores do Japão.

A preocupação dos críticos se faz verdadeira ao apontar que, embora o apoio do estado seja muito bem vindo, a nova fábrica operada pela TSMC e a Sony não deverá também ser o sonho que muitos imaginam.
A planta precisará de 1500 funcionários, mas não há garantias de que as vagas poderão ser preenchidas.
Diferente da indústria tradicional, a mão de obra para os semicondutores é altamente qualificada e há poucos desses profissionais no mundo.

Se no Brasil a CEITEC tivesse sido liquidada, por exemplo, os profissionais que lá trabalham seriam imediatamente absorvidos pelo mercado internacional no processo conhecido como fuga de cérebros, dado que capacitar pessoas para esse tipo de operação demora muito mais do que simplesmente construir uma planta industrial.
Esforço estatal e social
A participação do estado no desenvolvimento da indústria de semicondutores é fundamental para manter a indústria japonesa competitiva no mundo. Em especial, as companhias chinesas são fortemente impulsionadas pelo estado.
Para isso, é preciso não só o esforço do governo, de acordo com Tetsuro Higashi, ex-presidente da Tokyo Electron Ltd., empresa de vanguarda na produção de semicondutores, o apoio da sociedade é fundamental.

“O governo precisa explicar de forma minuciosa como a tecnologia de semicondutores são utilizados nos diversos setores econômicos e como ela tornará a nação mais próspera e criará mais empregos”, disse Tetsuro Higashi em entrevista ao The Asashi Shimbun.
E foi categórico: “É fundamental explicar para a sociedade que a tecnologia desenvolvida por essa indústria é a pedra angular que permitirá que a indústria japonesa continue competitiva a nível internacional.
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Mais investimentos e mais subsídios
Como a base da vida moderna depende de semicondutores para tudo, as nações desenvolvidas estão investindo pesado no setor, bem como empresas.
A TSMC, parceira da Sony no Japão declarou em 2021 que investirá US$ 100 bilhões em três anos.
A estadunidense Intel também deverá investir US$ 100 bilhões nos próximos anos, o dobro do que o governo dos EUA e da União Europeia investirão em 10 anos para pesquisa e desenvolvimento dos semicondutores.

Para Tetsuro Higashi, o Japão precisa investir ao menos JP¥ 10 trilhões (US$ 87 bilhões) nos próximos 10 anos para apoiar e ressuscitar sua já existente indústria e não ficar para trás dos líderes globais.
Mas tão importante quanto investir em pesquisa e tecnologia, é indispensável investir na formação acadêmica para suprir a mão de obra qualificada que a indústria exige.
Formação e aplicação devem andar lado a lado para manter o equilíbrio a longo prazo.
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